As declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que acusou Israel de genocídio e comparou a guerra na Faixa de Gaza com a matança de judeus por Adolf Hitler, podem servir de combustível para a manifestação convocada pelo ex-mandatário Jair Bolsonaro para o próximo domingo (25), em São Paulo.
O líder de extrema direita espera reunir uma multidão de apoiadores na Avenida Paulista para tentar demonstrar força diante do cerco da Polícia Federal contra seu círculo mais próximo, e aliados já usam as falas de Lula sobre Israel para mobilizar a base bolsonarista.
"Lula entregou esse tema de bandeja e de maneira absolutamente desnecessária para Bolsonaro explorar no domingo e tentar desviar a atenção dos próprios problemas", diz à ANSA o cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
De fato, deputados bolsonaristas já anunciaram um pedido de impeachment contra Lula por suas críticas a Israel, e o próprio ex-presidente dedicou as últimas postagens nas redes sociais a declarar apoio ao país judeu, incluindo a republicação das críticas do premiê Benjamin Netanyahu ao petista.
O tema Israel é especialmente caro ao eleitorado evangélico, um dos grupos mais resistentes a Lula e um dos mais fiéis a Bolsonaro. "Isso vai municiar a retórica bolsonarista e pode ser um elemento para a manifestação na Paulista", ressalta Prando.
Carlos Vidigal, doutor em relações internacionais e professor de história na Universidade de Brasília (UnB), vai mais longe e afirma que a crise pode repercutir até nas eleições municipais de outubro, especialmente nas capitais, como São Paulo, onde o esquerdista Guilherme Boulos (Psol) terá o apoio de Lula e do PT para desafiar o prefeito Ricardo Nunes (MDB), aliado de Bolsonaro.
"O PT parece não ter percebido a relevância do tema para a comunidade judaica, que tem seu peso eleitoral em São Paulo, sem falar dos próprios evangélicos, que conseguiram vincular o neopentecostalismo com o judaísmo", explica Vidigal.
Segundo o professor da UnB, é difícil mensurar o tamanho da influência das declarações de Lula nos meios bolsonaristas, mas o tema "será explorado sistematicamente" pelos apoiadores do ex-capitão do Exército.
Para Bolsonaro, o ato de 25 de fevereiro é uma tentativa de mostrar poder político diante das investigações sobre a suposta trama golpista após as eleições de 2022, que já levaram até à apreensão do passaporte do ex-presidente.
No entanto, de acordo com Prando, a manifestação "não vai mudar a situação" de Bolsonaro. "A gente pode se surpreender com uma Paulista tomada de pessoas, o que não seria pouca coisa, mas a questão é aquela ideia de que a montanha pariu um rato. Você faz um grande evento que provavelmente não vai impactar as investigações, pelo que se conhece do Supremo Tribunal Federal", diz. (ANSA)
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