A Polícia Federal (PF) apontou que uma milícia digital que atua contra a democracia e as instituições usa a estrutura do chamado "gabinete do ódio", grupo que seria formado por aliados do presidente Jair Bolsonaro.
A suspeita é que esse grupo atue dentro do Palácio do Planalto, por meio de funcionários comissionados do governo. A informação consta em um relatório elaborado parcialmente pela delegada Denisse Ribeiro, responsável por conduzir os inquéritos das fake news e das milícias digitais, enviado ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.
Sobre Bolsonaro, investigado formalmente no inquérito, o documento relaciona os indícios levantados a outras duas investigações em andamento, o que na avaliação da PF revela "semelhança no modo de agir" e "aderência ao escopo descrito na hipótese criminal".
De acordo com o documento, o grupo seria orquestrado com propósito de difundir ataques e desinformação, criando e deturpando dados para obter vantagens e auferir lucros, buscando, desta forma, ganhos políticos, ideológicos e financeiros.
"Identifica-se a atuação de uma estrutura que opera especialmente por meio de um autodenominado 'gabinete do ódio': um grupo que produz conteúdos e/ou promove postagens em redes sociais atacando pessoas (alvos) - os 'espantalhos' escolhidos - previamente eleitas pelos integrantes da organização, difundindo-as por múltiplos canais de comunicação", diz o texto.
A delegada classificou a atuação do grupo em quatro fases. Na primeira, denominada de eleição, são escolhidos os alvos. Na segunda, a preparação, são definidas as tarefas dos membros dos grupos e definidos os canais em que as mensagens serão difundidas.
Já a terceira, o ataque, diz respeito às "diversas postagens com conteúdo ofensivo, inverídico e/ou deturpado, formulado por várias fontes, por diversos canais e intensificado pela transmissão/retransmissão a integrantes do grupo que possuem muitos seguidores/apoiadores nas redes sociais, potencializando a difusão da notícia".
Por fim, de acordo com o relatório, ocorre a reverberação, que é a "multiplicação cruzada das postagens por novas retransmissões, complementadas ou não com novos elementos agregados, inclusive realizada por autoridades públicas e/ou pelos meios de comunicação tradicionais".
Para ela, a estratégia do grupo tem sido explorar os limites entre crimes contra a honra e a liberdade de expressão, o que cria uma falsa ideia de que a Constituição permite a publicação de qualquer conteúdo sem que o autor seja responsabilizado..
"Sob essa ótica, tem sido rotineiro questionar os limites entre a prática dos chamados delitos de opinião (especialmente calúnia e difamação) e a amplitude da liberdade de expressão, gerando uma ideia de que a Constituição Federal criou uma zona franca para a produção e divulgação de qualquer conteúdo sem risco de responsabilização. Não é o que ocorre com qualquer Estado Democrático de Direito", afirmou Denisse, ressaltando que "é preciso proteger o discurso livre".
A delegada relacionou a investigação das milícias digitais a outros dois inquéritos: o que apura a live do dia 29 de julho do ano passado para questionar a segurança das urnas eletrônicas e o relacionado ao vazamento de uma investigação sigilosa da PF sobre uma tentativa de ataque hacker aos sistemas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Neste último, a PF concluiu que Bolsonaro cometeu o crime de violação de sigilo.
"Por se tratar de investigação do que se supõe ser a atuação de organização criminosa, também se encontram no escopo deste inquérito outros eventos relacionados a esse grupo", escreveu.
No entanto, Denisse reforça que é necessário realizar novas apurações. "Há, da mesma forma, lacunas que precisam ser preenchidas, indicadoras da necessidade de realização de novas diligências voltadas à individualização dos fatos praticados, com indicação de autores e partícipes", completou. (ANSA)
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